Pais Helicóptero: Protegendo ou Preparando Seus Filhos para o Futuro?
Oct 31, 2024 at 7:23 PM
Quando uma criança completa dois anos, os pais muitas vezes não a deixam brincar no escorregador do parquinho, com medo de que ela se machuque. Aos sete anos, após uma briga com um colega, o assunto é discutido por telefonemas entre adultos. Aos 12 anos, se o boletim escolar registra uma nota baixa, o clima em casa é de luto e indignação. Já aos 25 anos, na primeira entrevista de emprego, esse jovem vai acompanhado do pai ou da mãe, preocupados com a segurança e o desempenho do filho que agora precisa "brincar no parquinho de adultos" sem ter tido a chance de se machucar na infância. Esse é o retrato da geração de "pais helicóptero", que estão sempre voando baixo ao redor dos filhos, numa tentativa de protegê-los de qualquer risco ou adversidade.
Proteger ou Preparar: O Dilema dos Pais Helicóptero
A Falta de Autonomia e Suas Consequências
Essa falta de estímulo à autonomia, percebida na primeira infância em inabilidades como não saber amarrar o tênis ou comer sozinho, ganha contornos mais sérios e sutis conforme a idade avança. "Essas crianças criadas por pais superprotetores acabam ficando desprotegidas, não sabem se defender nem se relacionar. Mesmo porque quando eram pequenas não podiam nem escolher a roupa", explica Cláudia Tricate, diretora do Colégio Magno e psicóloga.Tudo isso, não raro, desencadeia doenças mentais como ansiedade e depressão. Gustavo Estanislau, psiquiatra da infância e adolescência, explica que do ponto de vista biológico, todas as pessoas têm um sentido de alerta que tende a se adaptar à medida que a criança vive situações como queda de uma árvore, nota ruim na escola ou briga com um colega. Quem é privado dessa experiência, tem esse sentido despertado de forma exacerbada com questões que surgem no decorrer da vida.A Busca pela Perfeição e Suas Consequências
Professora da pós-graduação da Faculdade de Educação da USP, Silvia Colello explica que a expressão "pais helicóptero" deve ser interpretada na esteira de dois outros termos: "geração canguru" e "hiperpaternidade". A geração canguru é aquela que não sai de casa, fica na bolsa e demora para se assumir. Já a hiperpaternidade tem relação com a superproteção por conta da expectativa de criar um "hiperfilho", que está sob pressão para ser perfeito. "E ele acaba se tornando um 'hipofilho', aquele que não sabe nem se defender, não sabe que rumo vai tomar."Muitas crianças e adolescentes crescem acreditando nessa supremacia que, em tese, garantirá um futuro promissor. Uma autopercepção questionada apenas quando já são praticamente adultos. Colello explica que, ao chegar na universidade, aquele jovem que a vida inteira foi o melhor aluno da sala, se vê entre iguais, sem ser o destaque. E, não raro, isso gera uma angústia que ele não consegue dar conta.O Caminho para a Autonomia
Apesar do prognóstico complicado, é sempre possível mudar o rumo dessa jornada. E sempre é tempo para que pais e mães ajustem e revejam as rotas. "Os pais não devem se sentir culpados, mas abertos a repensar algumas coisas", afirma o psiquiatra Gustavo Estanislau.Um ponto importante é considerar que as crianças precisam desenvolver duas habilidades básicas: regular a emoção e se adaptar ao mundo. Ambas, só vêm com a experiência. E vivenciar é se expor aos riscos comuns da idade. "Quando os pais começaram a perceber e viver o desprendimento, a criança volta pra casa super feliz."Cláudia Tricate, diretora do Colégio Magno, sempre dá uma dica certeira: "Sempre falo que, quando estiverem numa situação assim, devem pensar: 'devo proteger ou preparar?'. Olhar sob essa perspectiva ajuda muito".Silvia Colello lembra que autonomia é um caminho de mão dupla: envolve orientar, mas também chamar a criança e o jovem para participar das decisões e assumir responsabilidades. "Ao mesmo tempo em que você chama, tem de ter escuta. Os pais precisam escutar antes de falar suas verdades, seus valores e seus projetos de vida. Estar junto é criar afastamento para dar vez para o outro."