Quase 14 mil filhos separados de pais com hanseníase aguardam pensão especial

Jul 10, 2024 at 11:01 AM
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Justiça Tardia: A Luta pelos Direitos dos Filhos de Hansenianos

Após anos de espera, uma lei histórica foi aprovada para conceder pensão especial e vitalícia aos filhos separados de pais com hanseníase durante o período de isolamento compulsório no Brasil. No entanto, a demora na promulgação do decreto tem deixado esses indivíduos, muitos já idosos, em uma situação de incerteza e frustração. Essa é uma batalha pela reparação de um passado sombrio, marcado pela discriminação e violação dos direitos humanos.

Uma Dívida Histórica a ser Saldada

A Lei Aprovada, Mas Ainda Não Promulgada

A lei que estabelece o pagamento de pensão especial mensal e vitalícia aos filhos separados de pais com hanseníase foi aprovada pelos senadores e sancionada pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, em novembro do ano passado. No entanto, esse decreto ainda não foi promulgado pela Casa Civil e pelo Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania. Estima-se que quase 14 mil pessoas em todo o Brasil tenham direito a essa pensão, sendo 500 delas no Amazonas.Segundo Thiago Flores, do Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan), "os filhos estão tendo seus direitos novamente violados na medida que 'ganharam', mas ainda não puderam nem fazer os requerimentos" para solicitar a pensão especial. Ele considera essa demora um "absurdo", tratando-se de uma "reparação histórica no campo dos direitos humanos".

A Luta Contínua do Morhan

O grupo de trabalho do Morhan Nacional tem se reunido com representantes do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania para discutir a demora na promulgação do decreto da Lei n.º 14.736/23. Essa lei, sancionada pelo presidente Lula em 24 de novembro de 2023, inclui os filhos separados pelo isolamento compulsório da hanseníase na Lei 11.520/07 e concede uma pensão especial vitalícia às vítimas dessa política higienista que vigorou no Brasil até 1986.Segundo Pedro Borges da Silva, coordenador do Morhan no Amazonas, há cerca de 500 pessoas aguardando o benefício. O Projeto de Lei 3023/2022, que concede a pensão vitalícia aos filhos separados dos pais hansenianos até 1986, foi aprovado recentemente na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado e agora aguarda votação no Plenário. O projeto prevê uma pensão vitalícia de um salário mínimo para os filhos de pessoas com hanseníase colocados em isolamento compulsório.

O Impacto Pessoal e Emocional

A assistente social e filha de pais hansenianos, Kátia Regina Pereira de Souza, relata sua experiência de separação e humilhação. Kátia nasceu na Colônia Antônio Aleixo, em Manaus, e foi separada de sua família quando tinha cinco anos, sendo entregue para adoção. "Sofri muito, apanhava. Eles não tinham carinho por mim e não me tratavam como filha," contou Kátia, que após anos reencontrou a mãe biológica, porém, a mãe, além de idosa, está debilitada. Kátia é uma dessas filhas que esperam que pela pensão vitalícia.

A Hanseníase no Brasil

A hanseníase se manifesta por meio de manchas na pele com perda de sensibilidade e alterações nervosas. É uma doença infecciosa causada pela bactéria Mycobacterium leprae, transmitida principalmente por via respiratória em contatos prolongados. O Brasil ocupa o segundo lugar mundial em casos de hanseníase, com 28.660 casos registrados, atrás apenas da Índia. No Amazonas, foram registrados 384 casos em 2022, conforme a Fundação Hospitalar Alfredo da Matta (Fuham).Essa doença, historicamente estigmatizada, levou a políticas de isolamento compulsório que resultaram na separação de famílias e na violação dos direitos humanos. A aprovação da lei de pensão especial é um passo importante para reparar esses danos e reconhecer o sofrimento daqueles que foram afetados por essa trágica história.